Saturday, August 24, 2013

Amor e suas tensões

Tomava banho e escrevia mil livros. Tinha diversos rascunhos na caixola. Vários rolos de frases feitas e desfeitas e misturadas. E um só tema, o amor. Sim, o tal amor. Perverso, às vezes. Safado. Desequilibrado. Antiquado e moderno. Eis o amor. Um amor que trouxera flores e dores. Ah, todo amor tem dor e por ser amor, se encarrega de amar também, nem que seja um pouco, ou que ame errado para uma das partes, mas é amor. Sim, amor é amor. E amor é fatal. E foi por este sentimento que ela, na noite anterior, encontrava-se em um bar a engolir vodkas e mais vodkas. Sabia que nenhum gole daqueles a faria feliz ou roubaria sua dor, mas o racional pouco importava ali. A mentira sempre vale mais em uma hora dessas. Nem o amor é racional. Imagina a dor que ele causa. A dor de amor. Ah, tenha paciência. O que quer o amor? Ser amado não quer não, pensava aquela que havia sido entregue por ela mesma nas mãos daquele macho charmoso. O charme é tão fatal quanto o amor. Dois vigaristas que te roubam de você mesmo. E é tão bom amar. Dizem que é lindo amar. Quem não quer um amor levante a mão. Todos riem e ninguém admite a solidão que o amor traz consigo, porque a alegria de amar pesa mais. Sim, pesa mais. Então, as lágrimas escorriam e não havia vergonha da multidão não, chorava com toda a pureza do sofrimento, parecia ter o desejo de se lavar do amor. E quem disse que ele vai embora assim. O amor é obstinado e o ser humano mais equilibrado é capaz de perder a paciência com tal sentir. Chorava, soluçava e engolia inúmeras doses. Tanto líquido jorrado, pelos olhos, pelas garrafas, pelos copos, pela fonte da praça. Pensava em aproveitar tanto fluido para algo útil. E o amor, é inútil? Queria ver um fruto decente do amor. Já quase se avistava os raios solares. No êxtase do torpor, discou. Sem resultados, óbvio. Um amor que machuca, foge. Amor covarde, mas amor. Por que me deixou ver? Este era o questionamento que ela queria ter deixado na caixa postal dele. Ela não queria ter visto. Ver é fatal. Ela um dia ouvira uma conversa que o seu amor estava envolvido em um relacionamento extraconjugal e opinou por não dá atenção, mas ver é pesado. Quando você simplesmente ouve algo, você faz sua escolha se realmente quer ver esse som. Mas ver com os olhos é outra coisa, é de uma nitidez inigualável e uma dor incomparável. É quase uma bofetada surpresa. Apunhalada pelas costas, sentia-se assim. O amor bate. E este adorável sentimento a surrou com a visão de uma fotografia. Na foto, ele enlaçava ela que sorria mostrando toda a arcada dentária. Belo sorriso, vamos admitir. A moça cuspia a felicidade através do belo sorriso.Na imagem, o casal denunciava um contentamento juvenil, chegando a ser comovente. O amor é patético. O fato é que a morena está feliz com o amor dela. O mesmo amor da outra que chorava. A foto parecia uma dançarina de bordel, exibindo-se, mostrando-se, oferencendo-se. Oferecia para ela a verdade. Denunciava o triângulo. Quem é que faz questão da verdade aqui? Todo mundo quer ser é amado. Latejava em sua cabeça uma discussão debatida em monólogo. Havia parado de escorrer lágrimas e ela já não olhava para o telefone. Aquilo fora o desequilíbrio do impacto que a desilusão causa. Agora carregava o olhar mais perdido que antes, agudamente ofuscado. E ela pensava que não precisava se deixar de ser amada pelo macho charmoso, pelo macho que ela amava. É, o amor tem essas tensões.

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